Mudança pode ser definido como algo que perturbe nossa rotina habitual ou zona de conforto. Seja por escolha própria ou não, mudar é difícil – e pode desencadear medos, inseguranças e ansiedade. Infelizmente (ou felizmente) a gente não tem pra onde fugir: mudança é uma constante na vida de todos.
“Não há nada permanente exceto a mudança.”
– Heráclito
Mas será que não existem estratégias para lidarmos com elas de uma maneira mais leve e menos desafiadora?
Eu acredito que sim. E entender como, nos dá muito poder sobre nossas vidas.
Eu já morei em 4 países diferentes, já desisti de um casamento marcado, já mudei do mundo corporativo pra vida de empreendedora e depois pro mundo corporativo de novo. Já terminei e fui terminada. Já precisei mudar de emprego – e de área – por forças maiores. Já mudei de estilo e de gosto tantas vezes que perdi a conta. Mudo de opinião com frequência pois amo sentir que estou em evolução. Mas isso não quer dizer que o frio na barriga não apareça toda vez que decido uma mudança. E também não quer dizer que me sinta tranquila quando uma mudança inesperada acontece comigo. Se tem uma coisa com a qual a gente nunca aprende a não se importar, nem que seja um pouquinho, é a mudança.
Mas eu defendo que é possível, sim, aliviar esse processo. Afinal, mudanças vão acontecer – e só nos resta, para o nosso bem-estar e saúde mental, aprender a lidar com elas.
Mudança induz incerteza, o que gera ansiedade
Independente da escala ou origem, mudanças geram imprevisibilidade. E imprevisibilidade nos mostra que não estamos no controle. É exatamente essa falta de controle que gera, mesmo que em proporções distintas, ansiedade em todos nós.
No Episódio #01 do Morada Podcast, falamos exatamente sobre isso. Eu e Má compartilhamos desafios que enfrentamos ao nos mudarmos pra Suíça – mesmo sentindo que nos preparamos pra essa mudança. Acontece que a vida sempre nos surpreende. Nossa sensação de controle é irreal.
Pensa comigo: o que você REALMENTE consegue controlar em sua vida?
A falsa sensação de controle
Não se sinta sozinho. Todos nós, seres humanos, temos essa necessidade de controle. Sua intensidade varia de pessoa pra pessoa, mas ela está presente em cada um de nós – mesmo que não queiramos admitir. Isso nos traz tranquilidade. É confortável saber “o que vem a seguir”.
A gente quer controlar como as pessoas nos veem e o que as pessoas pensam de nós, quer controlar nosso sucesso profissional, quer controlar a vida de quem amamos e o que vai acontecer no nosso dia-a-dia. Eu, por exemplo, me sinto extremamente ansiosa quando sinto que fui mal interpretada – porque, nessas situações, eu vejo o quanto o que alguém absorve do que eu falo ou faço está totalmente fora do meu controle. Também me sinto ansiosa quando minhas expectativas são frustradas. Expectativas são, de maneira geral, um desejo de controle disfarçado. Mas tão certa quanto a nossa necessidade de controle, é a imprevisibilidade da vida. Nem nós mesmos somos previsíveis.
Diariamente temos a falsa sensação de estarmos no controle – mas entender que não precisamos dessa sensação é libertador.
É claro que se preparar para mudanças é essencial – como reforçamos no Episódio #01 do Morada Podcast. Mas o que não podemos deixar de trabalhar é nossa adaptabilidade. Como lidar de maneira leve com o que não podemos controlar?
Problema ou oportunidade?
Nossa mentalidade tem um impacto enorme em como vivemos nossas vidas. Acreditar que existe um significado em praticamente qualquer situação que vivenciamos, apenas esperando que a gente o encontre, nos ajuda a enxergar mudanças – e seus consequentes desafios – como oportunidades ao invés de problemas.
Às vezes, a oportunidade é de reflexão: uma lição aprendida para quem sabe fazermos diferente numa próxima. Outras vezes, ela é mais prática: temos uma expectativa frustrada agora para recebermos algo melhor depois. Quantas vezes você já deparou com uma situação assim? Não conseguiu o que imaginava ser o ideal, mas acabou conquistando algo que fez mais sentido depois?
Eu sou uma pessoa muito positiva e tenho que cuidar para não ver a vida cor de rosa demais. Mas reforço sempre o quanto essa mentalidade, que me faz acreditar que tudo acontece por uma (boa) razão, me ajuda.
Eu aprendi que por mais desafiadora que seja a mudança, a falta de controle ou a quebra da expectativa, eu sempre posso enxergá-la com as lentes da oportunidade. Costumo brincar que temos sempre dois óculos para enxergar a vida: um óculos escuros e outro, com várias mini-luzinhas em torno das lentes. Em um contexto desafiador, quando estamos enfrentando uma situação inicialmente de “pouca luz”, qual óculos você acha que te ajuda a enxergar melhor?
Os óculos escuros, como você já deve ter imaginado, é o óculos do problema, enquanto a lente com luzinhas é da oportunidade. É uma analogia simples, mas se você se apoia em representações como eu pode, sempre que enfrentar uma mudança mais ‘complicada’, pensar: espera, qual óculos eu escolho colocar agora?
E não, os óculos não são uma poção mágica que eliminam medos, angústias e tristezas. Mas fazem com que elas não durem tanto tempo. Porque basta olhar com calma para a situação que conseguimos ver uma oportunidade ali. E quando fazemos isso, encontramos um porquê, uma razão, e nos preparamos para seguir rumo ao movimento.
Movimento e adaptabilidade
Algo muito comum de acontecer com todos nós quando enfrentamos mudanças é nos colocarmos na posição de vítima. Entenda isso pra nunca se esquecer: o pior lugar que podemos nos colocar é o de vítima. Porque assim deixamos de ser protagonistas de nossas vidas. Pensamos: a culpa de tudo que nos acontece é do outro – coitadinhos de nós. O que se traduz como: nada que eu fizer, resolve – já que não tenho responsabilidade ou impacto no que me acontece. Isso nos coloca em uma posição de inércia, sem nenhum movimento pra mudar a situação. Sem nenhum movimento em busca de nos adaptarmos ao novo contexto e fazer o nosso melhor para transformá-lo em algo mais favorável pra nós.
Eu e a Má falamos muito aqui sobre movimento. Agir, tirar do papel, fazer acontecer. Mas a gente frisa também a importância do simples movimento de se levantar, tomar um banho e ir caminhar. O simples fato de sair dessa inércia vai estimular seu cérebro e suas emoções pra seguirem em direção a uma reflexão. Quando o desafio de encarar a mudança é grande e a gente fica acolhido em nosso casulo na cama ou no sofá sem querer nem se mexer, o primeiro passo é mesmo focar nos pequenos movimentos. Um pé de cada vez, no chão, em direção aos seus primeiro caminhar.
E quando esse movimento acontecer, pega o óculos. Escolhe o das luzinhas, e procure as oportunidades antes escondidas nessa situação.
É sempre fácil? Não – não mesmo. Porque para o movimento acontecer, pra que as luzinhas dos óculos se acendam e pra que a gente tenha disposição para efetivamente colocá-los no rosto, a gente precisa de pelo menos um pouquinho de algo chamado autoestima.
Como anda a sua autoestima?
Fiz essa pergunta a algumas amigas recentemente e muitas responderam “um lixo”. Me assustei mas nem tanto. A gente vive em uma era da comparação. Mais do que nunca, a grama do vizinho é muuuito mais verde que a nossa. As redes sociais intensificam os sucessos e ocultam as frustrações, os sentimentos verdadeiros e os desafios que todos nós, todos os dias, enfrentamos.
É mesmo, muito comum, desenvolvermos essa sensação de inferioridade. Acharmos que com a gente, tudo é pior. Vemos provas diárias que não temos tanto dinheiro, tanto sucesso, tanta felicidade, nem tantas oportunidades – ou ainda tanto amor -, quanto as pessoas que acompanhamos todos os dias online. Se a nossa autoestima não está fortalecida, isso tudo nos abala. E a gente vai se encolhendo, se questionando negativamente – e a cada desafio enfrentado, a gente vê mais problemas e se recolhe no casulo do vitimismo. Ainda passo por isso também. Você não está sozinho. Mas estou aprendendo a sair da inércia mais rápido.
Baixa autoestima afeta muitos de nós e tem inúmeros impactos em nossas vidas. Se você parar pra pensar, vai ver que, na verdade, é tudo cíclico. Baixa autoestima desencadeia necessidade de controle. Necessidade de controle, como já vimos, atrapalha o processo de adaptação em mudanças, pois gera ansiedade. E ansiedade, medo e vitimismo nos colocam em inércia, sem movimento. Sem movimento, a gente não consegue pegar os óculos das luzinhas, e não consegue enxergar as oportunidades da vida. E, sem isso, nosso valor próprio e nossa estima por nós mesmos são novamente afetados, o que desperta ainda mais necessidade de controle.. e por aí vai.
Como quebrar o ciclo?
Eu aprendi a me amar. Me dá até vergonha de escrever isso assim, tão sem filtros. Mas é verdade. Precisei a aprender a me comparar menos, me julgar menos e encontrar o meu valor. Precisei valorizar minhas conquistas sem culpa. Eu vivia em muita contradição: já me vitimizei culpando o mundo e os outros pelos meus desafios e me coloquei como pequenina, sem sorte, incapaz. Mas ao mesmo tempo negava minhas conquistas pois tinha vergonha por ter muito – comparado a tanto sofrimento que outras pessoas experenciavam. Eu vivia a culpa do sucesso, não querendo honrá-lo, e a vítima reclamona das dificuldades, achando que não as merecia. Não conseguia enxergar nada com leveza. Não conseguira comemorar conquistas nem enxergar oportunidades. Era tão fácil reclamar e culpar o mundo. Era tão fácil ter pena de mim.
Uma amiga uma vez comentou comigo: é confortável, né Quel, ficar na tristeza e não ter que se responsabilizar nem agir. E infelizmente é assim que enxergamos o momento quando estamos nele. Um conforto imediato – só não vemos as grandes consequências que ele tem.
Textos sobre autoconhecimento, podcasts sobre saúde mental e cursos de inteligência emocional me ajudaram bastante. É um processo longo e contínuo. Estudo há anos sobre comportamento humano e me uso de cobaia – vendo incríveis efeitos na minha vida. Mas nada teria adiantado se eu não tivesse aceitado que eu sou a protagonista da minha vida, que eu mereço minhas conquistas e que eu devo honrar meus desafios – e que se eu não fizer por mim, a minha vida vai ficar à mercê do acaso.
Resiliência e Auto compaixão
Mudanças nos ensinam sobre resiliência, flexibilidade e até auto-compaixão (menos julgamento e menos crítica a nós mesmos). E auto-compaixão, pra mim, sempre será o primeiro passo para lidarmos melhor com situações desafiadoras. Seja mais gentil com você mesmo. Não se defina como incapaz, azarado, complicado ou inferior. Se livre dos rótulos e busque amor próprio. Se você não consegue achar nada para amar dentro de si, busque ajuda profissional. Trabalhe a sua autoestima.
Depois, com essa pontinha de esperança, se mexa. Entre em movimento entendendo que você está no comando. E que isso não quer dizer que você tem controle da sua vida e das pessoas em torno de si, mas que você tem poder sobre suas ações. Que você é o protagonista. E que você pode escolher como agir. Que você pode direcionar as suas ações e a sua mentalidade. Esse é o momento em que você pode agir colocando os óculos certos. Lembra da pergunta: problema ou oportunidade?
Aceitar o que não podemos mudar e agir em direção ao que podemos é a chave pra resiliência. É a chave para a adaptabilidade. E é o que vai te guiar a entender que não precisamos ter o controle de tudo pra conseguirmos encarar mudanças com mais leveza. Podemos simplesmente aceitar e seguir em frente.
Aceitação
Aceitar a situação como ela é não significa que você a endossa ou que está satisfeito ou mesmo feliz com ela. Significa simplesmente que você entende que tudo o que você pode controlar na vida é você mesmo – e o que você escolhe fazer e dizer.
Aceitar é escolher conscientemente mais leveza ao invés de ficar se torturando com aquilo que você não pode mudar.
Aqui no Morar, eu e a Má sempre falamos que não buscamos instigar nas pessoas (nem em nós mesmos) a visão do: “aceite e deixe acontecer”, ou ainda “visualize o que você quer alcançar que tudo se resolve”. A gente defende a aceitação, sim, pela paz que ela traz (e reforça também a importância do exercício de visualização – papo pra outro dia). Mas essa paz (e esses exercícios), deve te impulsionar rumo ao um movimento. É o agir, seguido da aceitação e da vontade de melhorar o cenário atual, que tem o poder da transformação. É ele que faz o que você sonha e mentaliza se tornar realidade.
A gente precisa se movimentar rumo aos nossos desejos – ao invés de culpar tudo aquilo que não temos controle sobre. É esse movimento positivo que confere a tão esperada adaptabilidade.
E aí sim a gente conquista esse novo degrau, essa nossa evolução pessoal pro nosso próprio bem, rumo a uma vida mais leve e com muito mais bem-estar.
Como encarar mudanças daqui pra frente?
Trazendo Heráclito de novo, ele diz que uma pessoa não pode entrar duas vezes no mesmo rio. Isso porque o rio corre e nunca é exatamente o mesmo. E porque nós também mudamos e nunca somos os mesmos. Mudamos a cada segundo, nem que seja só um pouquinho.
Nós não temos controle sobre o rio, mas temos muito poder sobre nós.
Através dos nossos projetos, a gente espera te inspirar a ter esse olhar interno com mais frequência – e se descobrir, se entender e se fortalecer, para encarar os desafios da vida de forma mais saudável.
O Morada Podcast é o seu espaço de encontro com todo o seu potencial – através das nossas experiências, reflexões e questionamentos. Espero que esse texto e o podcast Mudanças tenham te inspirado, nem que um pouquinho, a ter mais autocompaixão, a colocar os óculos da oportunidade perante desafios, e ainda, a dar o primeiro passo para se tornar protagonista da sua vida.
Um grande beijo,
Quel
Escute nosso bate-papo sobre mudanças no Spotify:
Luiz Jr. Fernandes
Concordo, mudar nunca é fácil, contudo é algo necessário para haver evolução na vida! Parabéns pelo blog e pelas atitudes!
Raquel Furtado
Luiz Jr. FernandesValeu Luiz, obrigada pelo comentário
Juliana
Não poderia ter vindo num momento mais oportuno. Estou vivendo isso, sair do interior de São Paulo onde nasci e vivi até agora, meu 40 anos, sempre presa a família, para enfim viver o sonho da mudança, começar uma vida do zero, com novas experiências em um lugar totalmente novo e diferente. A escolha foi João Pessoa! Estou indo em alguns dias com marido e filho para conhecer e se Deus quiser, voltar só para arranjar tudo e partir de vez.